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| Mapas antigos ajudaram na localização de cemitério de escravizados do século 18 – (Foto: Silvana Olivieri) |
As escavações começaram no dia 14 de maio de 2024, e já no terceiro dia os arqueólogos encontraram fragmentos de porcelanas e objetos do século 19. Cerca de dez dias depois, surgiram as primeiras ossadas humanas — evidências que confirmaram as hipóteses levantadas por Silvana. “Trata-se de um espaço de memória apagada da cidade, onde milhares de vidas foram enterradas sem registro, sem cerimônia, sem nome”, relatou a pesquisadora.
Escavações revelam indícios do século 19
Mesmo após a descoberta, o terreno continua sendo utilizado como estacionamento. O MP-BA informou que o Iphan recomendou a suspensão imediata do uso do espaço, para que as pesquisas possam prosseguir sem interferências. Silvana Olivieri também solicitou formalmente ao órgão o reconhecimento do local como Sítio Arqueológico Cemitério dos Africanos, o que garantiria sua preservação e valorização como patrimônio histórico e cultural da cidade.
Os registros históricos analisados pela pesquisadora indicam que o cemitério funcionou por cerca de 150 anos, até 1844, quando a Santa Casa passou a operar o Cemitério do Campo Santo, no bairro da Federação. Durante esse período, corpos eram enterrados em valas comuns e superficiais, sem qualquer cerimônia religiosa.
Local guarda vestígios da escravidão e revoltas populares
A pesquisa mostra que a maioria das pessoas enterradas eram africanos escravizados, mas também havia indígenas, ciganos e pessoas pobres. Há ainda indícios de que participantes da Revolta dos Malês, da Conjuração Baiana (ou Revolta dos Búzios) e da Revolução Pernambucana possam ter sido sepultados no local, o que reforça o caráter simbólico e político do espaço.
A análise documental incluiu mapas e plantas do século 18, artigos de historiadores como Braz do Amaral (1917) e Consuelo Pondé de Sena (1981), além de um livro de 1862 escrito por Antônio Joaquim Damázio, contador da Santa Casa. Esses documentos foram fundamentais para localizar e confirmar a existência do cemitério.
MP-BA cobra medidas de preservação
Em nota, o Ministério Público da Bahia destacou que o achado representa “um marco para a história afro-brasileira e para a memória coletiva de Salvador”. O órgão deve acompanhar o processo de tombamento e a destinação do espaço, que pode se transformar em um memorial da escravidão.
O caso reacende o debate sobre como a capital baiana — primeira do Brasil e epicentro do tráfico de pessoas escravizadas no país — tem lidado com os vestígios de sua história colonial. O reconhecimento do local como sítio arqueológico seria um passo fundamental para resgatar a memória de milhares de pessoas que tiveram suas vidas apagadas pela escravidão.
Com mais de 100 mil corpos identificados até o momento pelas estimativas iniciais, o Cemitério dos Africanos da Pupileira se torna um dos principais achados arqueológicos do país, revelando um capítulo sombrio e, ao mesmo tempo, essencial da formação histórica de Salvador e do Brasil.


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